Comportamento de compras e o processo de vendas
Prof. FLAVIO NUSBAUM e Prof. DAVID ZINI
Não é de hoje que nos deparamos com situações como esta a seguir.
Sexta feira – 12:00h, ao final do encontro virtual da empresa “Máquinas e Soluções”, revenda especializada em empilhadeiras, grupos geradores, peças e serviços de manutenção, o clima está tenso. Afinal não é para menos, a receita está 35% abaixo do orçamento, está se perdendo diversos “bids” para novos concorrentes, especialmente os “chineses”, e, para completar a última notícia, vinda de uma das indústrias detentoras da marca mais importante representada pela empresa, chega a ameaça de cancelamento da exclusividade de representação na região que iniciou-se na fundação da empresa há 30 anos.
Neste cenário, o comitê executivo resolve que a solução passaria por contratar um novo Diretor de Vendas e Marketing. “Temos que trazer alguém com forte capacidade de desenvolver relacionamentos, experiência em gestão comercial e principalmente focado nos resultados”. diz o CEO da “Máquinas e Soluções”.
“Afinal nosso negócio depende muito do relacionamento com nossos clientes, sendo a confiança a principal conquista para se chegar aos bons resultados. Desenvolver uma equipe de vendedores de alta performance, que dominem todos os aspectos técnicos dos nossos produtos e saibam “vender”, é igualmente fundamental. E com certeza termos sistemas e controles internos que nos garantam fazer previsões “forecast” dos produtos e volumes a serem vendidos nos próximos meses é de suma importância. Precisamos diariamente do acompanhamento assertivo sobre todos negócios em desenvolvimento – “pipeline ou funil”.”
A empresa acredita que com estas medidas os resultados deverão aparecer, conclui o CEO na reunião virtual de acompanhamento gerencial de metas.
Aliás, as reuniões virtuais, outrora impensáveis para uma empresa tradicional como a “Máquinas e Soluções”, por conta das restrições sanitárias impostas pelas determinações legais e protocolos de proteção aos colaboradores, agora passaram a ser rotina e todos parecem estar muito bem adaptados. Se não fossem os pífios resultados da área comercial, poder-se-ia dizer que a empresa estava se saindo muito bem na “crise” em que o país e talvez o mundo estaria, por conta da pandemia.
Buscou-se entre os mais renomados executivos “comerciais” alguém com todos os predicados para o desafio. Quem mais se destacou no processo e por conseguinte contratado foi o Sr. Silva, experiente executivo de vendas vindo de multinacional com renomada marca de caminhões, ônibus e motores, cuja brilhante trajetória de “batedor de cotas” não deixava dúvidas de que era o que a “Máquinas e Soluções” precisava para resolver suas “dores” da primeira a última linha na demonstração de resultados.
Passados 6 meses os resultados não melhoravam. O Comitê estava atônito, afinal além de “perder o ano” poder-se-ia perder a “bandeira” da principal marca da empresa.
Qual seria o futuro da “Máquinas e Soluções”, perguntava-se o CEO, que também era o representante da família proprietária.
A continuidade do Sr. Silva na empresa já era questionada, afinal foi trazido a “peso de ouro”, e como os resultados não apareceram na velocidade que esse esperava, naturalmente os questionamentos começaram a surgir.
Os investimentos em ERPs (Enterprise Resource Planning) e integração com sistemas de gerenciamentos de vendas foram altos, tinha-se todos os números e detalhes das oportunidades de vendas, sabia-se sobre o andamento dos “Bids”, podia-se fazer previsões de número de negócios necessários, por produtos, por segmento, por marca. Gerencialmente os dados estavam disponíveis, mas as coisas simplesmente não aconteciam. Os clientes não fechavam com “Máquinas e Soluções”.
O que está de fato acontecendo?
Por um espectro imaginário temos os “clientes de transações” e do lado oposto “clientes de relações” – Build Customer Relationship that last – Dra.Jackson, Barbara Bud. (Lexington Books, 1985).
Estes opostos representam atitudes e comportamentos primordiais assumidos por “compradores” preferencialmente industriais e, embora assumindo que mesmo nas compras industriais são pessoas que tomam as decisões, poderíamos aceitar que os mesmos poderiam ser aplicados às compras individuais, portanto o que trataremos a seguir poderia ser aplicado a situações de compras entre indivíduos e organizações também.
Em outras palavras tanto faz se a sua empresa é uma empresa que faz negócios B2B (entre empresas) ou B2C (com o consumidor final), afinal de contas mesmo nos negócios B2B invariavelmente tem pessoas nas empresas que tomam as decisões.
A pesquisa da Dra. Jackson nos mostra que as decisões de compras consideram o risco como valor importante para tomada de decisão.
Este valor é menor se o horizonte de utilização de determinado produto ou serviço for de curto prazo. Se o mesmo puder ser, digamos, facilmente substituído, caso o atual não atenda as necessidades. Geralmente trata-se daqueles produtos cujo número de fornecedores é vasto e relativamente fáceis de serem acessados. Sim, existem várias opções boas no mercado.
Este conjunto de características permite aos “compradores” conhecer bastante sobre os detalhes técnicos deste tipo de produto. Afinal o mercado competitivo traz como consequência diversas avaliações independentes, materiais explicativos e publicações em variados canais, explanando de forma comparativa sobre os principais produtos do concorrente.
O resultado deste cenário é que o “poder” da escolha cresce do lado dos compradores, uma vez que eles conhecem o suficiente para parametrizar as características, benefícios e vantagens principais
antes da decisão. É possível convidar diversos fornecedores a participarem do “Bid”; consegue-se estabelecer as condições de compra e entrega, avalia-se comparativamente preços e condições de financiamentos e prazos, e por fim, simplesmente escolhe-se quem terá o “melhor pacote de oferta”. Neste tipo de negócio é comum ser utilizado um processo de RFQ – (request for quotation) e logo na sequência uma RFP – (request for proposal), onde faz-se uma tabela de pontuação para cada item, e aquele fornecedor que melhor pontua leva o “Bid”. Afinal, compradores são incentivados a buscar “savings” ou comprar o que lhes é demandado, pelo menor preço possível.
E a questão do “risco”? Ora, acredito ficar claro que o risco é minimizado, na medida que existem alternativas de fornecimento, conhece-se o que se está comprando e, caso exista erro, troca-se na próxima compra. Lembrem-se, estamos falando de horizonte de curto prazo.
Na verdade, aqui o conceito de “risco” está comungando com “custos de troca”, quer dizer, quanto menor o risco menor sempre o custo de troca, e vice-versa.
É fundamental entendermos que o conceito de custo, neste caso, não está restrito ao custo do produto ou serviço, e sim ao conceito de “TCO = Total Cost of Ownership” ou custo total de aquisição, portanto, inclui-se os custos totais de procurar, selecionar, comprar, receber, aprender a usar e tirar o melhor proveito. Deve-se incluir além dos custos transacionais os custos relacionados ao uso, como consumíveis, manutenções e possível revenda depois do uso e depreciação contábil.
Portanto, quanto menor o custo de troca de determinado produto ou serviço, mais “transacional tende a ser a relação entre Compradores e Vendedores.
Por outro lado, existem as situações extremamente opostas, cujo risco é potencializado pelo alto custo de troca.
Este custo é consequência de fatores como dificuldades para parametrizar ou comparar os fornecedores, poucos fornecedores acessíveis, alta dependência para implementação e ou treinamentos, padrões a serem atendidos, relação com mercado alvo da empresa, enfim, sendo então o horizonte de decisão de longo prazo.
A relação, portanto, é de longo prazo, pressupõe confiança corporativa, reputação para continuidade e “parceria” entre as empresas fornecedoras e clientes.
É característica deste polo do espectro o baixo ou limitado conhecimento dos “compradores” sobre os produtos. Pode-se dizer que o poder do negócio neste lado está mais para o “Vendedor”, que é percebido como um verdadeiro “Consultor” de quem os “compradores” mais dependeriam.
As decisões neste lado do espectro até consideram os aspectos dominantes do lado transacional, como características do produto, prazos de entrega e preços ou condições de compra, todavia não são dominantes.
O que determina a venda aqui é quem garantirá o menor risco.
Qual o vendedor que conseguirá melhor demonstrar alinhamento da sua empresa com as estratégias de longo prazo da empresa compradora.
O mapa de desenvolvimento de novos produtos e ou atualizações de versões, arquitetura de interconexão, cadeia de suprimentos, treinamentos, garantias, estabilidade financeira, plano de crescimento e desenvolvimento em P&D e por fim talvez o mais importante, a reputação da empresa, são recursos essenciais para ter-se sucesso neste tipo de negócio.
Afinal o custo de troca, aqui é alto. Quanto maior o custo de troca mais o comportamento entre Compradores e Vendedores será de “Relação”.
Levando-se em consideração a situação descrita acima, uma série de conceitos precisam ser aplicados e compreendidos, sendo que os principais são:
- Desenho e entendimento do processo de vendas
- Mapeamento do cliente e seus pontos de compra
- Entendimento das razões que levam um cliente a comprar e tomar a decisão
- Compreender o que é valor para o cliente e os “componentes” da “equação” valor
- As três fases que qualquer reunião de vendas deveria ter
Vamos olhar para cada uma com mais detalhes a seguir.
- Desenho do processo de vendas
Imaginem a seguinte cena, que muito provavelmente você já viu em algum sinal de trânsito de uma cidade brasileira.
Um menino, provavelmente descalço ou de sandálias de borracha, colocar um pacote de balas no seu espelho retrovisor, ele passa rapidinho, deixa o pacote e depois volta correndo para pegar o pacote ou o dinheiro que o comprador dará pelas balas.
Esse menino não sabe, mas ele tem um processo de vendas transacional, são duas etapas:
Etapa 1 – oferta – quando ele deixa o pacote no retrovisor
Etapa 2 – fechamento – quando ele recolhe o pacote ou o dinheiro.
Você já se perguntou porque em alguns casos os meninos fazem isso correndo e em outros apenas caminhando tranquilamente?
Novamente esses meninos não sabem da teoria, mas conhecem a prática como ninguém. Se você perguntar para um deles, “porque você faz isso correndo?” ele provavelmente irá responder: “eu tenho que vender X pacotes de balas por dia, e eu vendo um pacote a cada Y faróis, isso se eu correr, se eu andar não vou conseguir vender os X pacotes que preciso para levar o dinheiro que necessitamos lá em casa”.
Traduzindo a resposta do menino, ele faz correndo porque a taxa de conversão dele é baixa, afinal ele certamente preferiria passar o dia caminhando à correndo.
Portanto apurar a sua taxa de conversão é algo fundamental quando se fala em processo de vendas, e tanto faz se a sua empresa tem um processo de vendas transacional (semelhante ao menino vendendo balas), complexa ou consultiva.
Vendas complexas ou consultivas significa um processo mais complexo de vendas com mais etapas e necessidades específicas de entendimento das demandas, necessidades e requerimentos dos clientes, e, por consequência a apresentação da “solução ideal” para seu cliente quase que de forma customizada.
Concluímos então que, seja qual for o tipo da sua venda, complexa ou transacional, o desenho do processo de vendas, com suas etapas, o detalhamento sobre o que tem que acontecer em cada etapa é fundamental.
Tão fundamental quanto você definir qual o “gatilho” que habilita a mudança de uma etapa do processo para a outra. Esse “gatilho” nada mais é do que uma “ação” ou “informação” que caracteriza a mudança da etapa.
Vamos pensar num processo de vendas com cinco etapas, conforme a figura abaixo:
- Suspeita
- Oportunidade
- Negociação
- Fechamento
- Pós-vendas
Nesse processo conceitual, uma vez que o mesmo deve ser adequado à cada empresa e sua real necessidade, precisamos definir quais ações devem acontecer em cada etapa do processo e principalmente o gatilho para a mudança.
Esse gatilho é fundamental para que possamos gerar estatísticas intermediárias das taxas de conversão e que as mesmas sejam confiáveis. Afinal de contas se sempre promovermos a mudança de uma etapa do processo para outra etapa no mesmo momento (o tal do gatilho), as estatísticas ficam confiáveis, pois evitamos a “velha história” de que “eu evolui o negócio da suspeita para oportunidade porque achei que já era o momento”, assim eliminamos o “subjetivismo” da equação.
As imagens a seguir trazem um exemplo de ações que devem ser realizadas e o seu respectivo gatilho para a mudança da etapa, nesse exemplo o gatilho está sempre em vermelho.
Ter o processo comercial bem desenhado, inclusive com as ações que devem acontecer em cada etapa e seus respectivos gatilhos nos gera outras duas informações muito ricas para qualquer empresa, principalmente se essa gestão do processo de vendas for feita por um sistema de CRM –
Customer Relationship Management, ou Gestão do Relacionamento com o Cliente. A grande maioria desses sistemas de CRM, quando customizados com o processo comercial pode nos trazer três informações fundamentais, conforme a figura abaixo:
- Taxa de conversão – o sistema irá calcular quantas suspeitas que você precisa colocar no topo do funil para chegar a uma venda, no nosso exemplo a base do funil chamada aqui de pós-vendas
- Tempo da conversão ou ciclo comercial – que representa o tempo médio que leva para todo o processo comercial acontecer em todas as suas etapas. O sistema de CRM poderá calcular também os tempos intermediários das etapas intermediárias do funil, essa é mais uma razão para termos muito claro os nosso gatilhos para mudanças de etapas, afinal se o meu sistema e estatísticas são confiáveis e eu sei que em média a mudança da etapa oportunidade para negociação leva 30 dias, e, eu tenho uma oportunidade parada nesta etapa do processo há 45 dias, alguma coisa deve estar acontecendo, me dando um alerta para investigar.
- Ticket médio ou valor médio de vendas – essa informação tem grande valor para as empresas, pois com ela sabemos qual o valor em média que um negócio representa para a nossa organização.
Ao juntarmos essas três informações estatísticas a gestão comercial passa a ser uma gestão matemática. Se eu sei que minha taxa de conversão é de 10%, por exemplo, meu ciclo comercial é de 90 dias e o meu ticket médio e de R$ 100.000,00 eu só preciso fazer contas.
Se eu preciso de R$ 1.000.000,00 de faturamento em 90 dias, quantas suspeitas eu tenho que ter hoje?
Neste exemplo acima eu preciso de 100 suspeitas para que em 90 dias 10 delas virem negócio e eu tenha R$ 1.000.000,00 em caixa, uma vez que meu ticket médio é de R$ 100.000,00.
Daí a próxima pergunta é: quantos vendedores eu preciso para trazer 100 suspeitas, quantas ligações eu tenho que fazer, quantas visitas eu tenho que agendar? Ou seja, a gestão passa a ser novamente matemática.
- Mapeamento do cliente e seus pontos de compra
Independentemente se suas vendas são transacionais ou complexas é fundamental mapear seus clientes e seus pontos de compra. Quando falamos em mapeamento de cliente temos que identificar os quatro principais papéis no processo de compra de qualquer cliente.
Notem que em muitos casos pode haver o acúmulo de papéis em uma mesma pessoa, ou em muitos casos também pode haver mais de uma pessoa em um mesmo papel. A seguir os quatro papéis e o entendimento da importância de cada um deles:
- Power Buyer – PB – Decisor
- Technical Buyer – TB – influenciador
- Economic Buyer – EB – quem paga
- Coach – Amigo
Vamos olhar com calma cada um deles.
O PB é ou são aquelas pessoas que decidem por comprar ou não comprar de A ou de B, como o nome diz é aquela pessoa que tem o poder
O TB é ou são aquelas pessoas que não tem poder de decidir, mas tem poder de influenciar e no limite, de vetar a compra. Por exemplo, suponhamos que eu quero vender uma solução de software para a sua empresa. O PB gostou muito do software e está bastante inclinado a comprar a solução, mas ele pede para um analista da empresa, que entende de sistemas para avaliar a solução tecnicamente.
Neste caso o analista é o TB, e esse analista após os estudos volta para o PB e diz o seguinte: “gostei da solução, mas ela não se integra ao nosso sistema de gestão (ERP), e, isso seria um grande problema, por isso não recomendo a compra”.
Notem que esse TB não tem poder de decisão, mas sua opinião provavelmente acabou de vetar essa compra por parte do PB.
Já o EB é aquela pessoa ou pessoas que pagam as contas. Essa figura no processo também não tem poder de decisão, mas mais uma vez tem o poder de veto. Suponhamos que no mesmo exemplo acima o TB aprovasse o sistema e suas integrações, e o EB falasse o seguinte para o PB, o sistema é ótimo, mas não temos orçamento e caixa para comprar esse sistema.
Note mais uma vez que o EB também não decide nada no processo de compra, mas também pode vetar.
Chegamos afinal o Coach, nosso amigo dentro da organização. Nossa experiência mostra que somos muito bem-sucedidos quando conseguimos fazer um mapeamento do cliente e desenvolver um Coach, aquela pessoa que nos defende dentro da empresa, nos passa informação “privilegiada”. Notem que aqui não estamos falando em qualquer tipo de informação confidencial ou ilicitude, mas sim de informações do tipo: “O PB gostou da solução, mas o que está pegando é a integração com o ERP, será que o TB entendeu que não pode ser integrado?” ou “A sua proposta está ótima, o que está pegando é a condição de pagamento, se você facilitá-la pode ser que seja mais fácil de fechar o negócio”.
Portanto o que deveríamos fazer para as contas mais relevantes é literalmente desenhar o mapeamento do cliente, conforme o exemplo abaixo.
Notem que na figura acima além de ter o desenho do organograma do cliente, principalmente das áreas da empresa que me interessam temos também mais algumas informações fundamentas, sendo elas:
- Polaridade da pessoa:
- Flecha para cima quando a pessoa é favorável à nossa oferta
- Flecha para o lado quando a pessoa é neutra
- Flecha para baixo quando a pessoa é contrária
2. Nível de acesso
-
- Sinal verde quando temos “livre” acesso à pessoa
- Sinal amarelo quando temos “algum” acesso
- Sinal vermelho quando não temos “nenhum acesso”
Nesta hora o Coach, mais uma vez, tem papel fundamental no processo, afinal ele poderia nos ajudar a encontrar caminhos para neutralizar as polaridades negativas e nos abrir os faróis de acesso. Seja através de informações, dicas, agendamento de reuniões, etc.
Notem que mesmo que tenhamos vendas transacionais o mapeamento desses papéis continua sendo fundamental. Para exemplificar vou contar uma história que aconteceu comigo.
Certo dia estava trabalhado em casa e tocou telefone, minha mãe perguntou se eu poderia ajuda-la a resolver um problema no seu celular na loja da operadora. Peguei meu carro, passei na casa dos meus pais e fomos ao shopping.
Fomos até a loja da operadora e resolvemos a questão, já na saída minha mãe me perguntou se poderíamos da uma passada numa loja de fogões para ela ver um fogão novo para a casa dela. Fomos até uma das lojas.
Como eu sempre costumo dizer, se eu estou andando pela rua, shopping ou em qualquer outra situação, por incrível que pareça, eu estou trabalhando; seja observando o comportamento humano, seja fazendo contas mentais para ver se a conta daquele negócio “fecha” ou não.
Chegando na loja, meus pais foram ver o fogão e eu fui “trabalhar”. Notei um casal jovem com uma senhora vendo uma geladeira com o auxilio de um vendedor, não tive dúvidas, fui para a geladeira do lado e fingi que estava interessado e fiquei apenas “de ouvido” na conversa.
O vendedor estava justamente fazendo algumas perguntas para o casal e a senhora, para tentar identificar quem tinha qual papel no processo de compra da geladeira.
Suponhamos que a cena fosse a seguinte:
“Filha essa geladeira é meu sonho, água na porta, gelo na porta, freezer ao lado e não em cima”, claramente a mãe era a TB na história e a filha a PB.
Qual a chance de a filha decidir comprar essa geladeira? Eu diria que alta, mas e se a frase da mãe fosse a seguinte: “Esse freezer do lado é uma porcaria, não cabe uma pizza congelada nele, é muito estreito”, neste caso qual a chance da filha (PB) comprar essa geladeira? Muito provavelmente menor!
Vamos supor que o que estava acontecendo foi a 1ª cena descrita, a TB aprovava a compra, a PB estava muito inclinada a comprar, aí surge o EB, o rapaz, que diz: “só tem um problema, essa geladeira custa R$ 12.000,00 e nós não temos dinheiro para isso!”.
Qual a chance de vender essa geladeira? Provavelmente pequena. Claro que nessa hora a PB faz uma cara de coitada, triste e decepcionada, o vendedor entra e fala, “calma, essa geladeira custa na verdade 24 prestações R$ 650,00”. Aí eu pergunto, qual a chance de existir a venda para essa casa?
Esse exemplo é apenas um exemplo de como em vendas transacionais esse mapeamento também é fundamental!
- Entendimento das razões que levam um cliente a comprar e tomar a decisão
Uma vez que temos o nosso processo de vendas desenhado e estamos fazendo o mapeamento dos principais atores envolvidos no processo, chegamos ao momento de compreendermos os quatro únicos motivadores que levam uma pessoa ou empresa a comprar algo.
- Ganhar dinheiro – as pessoas e empresas são motivadas em muitos casos a comprarem algo que lhes ajude a ganhar dinheiro
- Economizar dinheiro – da mesma forma que as pessoas e empresas querem ganhar dinheiro, elas também são movidas a economia de dinheiro.
- Economizar tempo – como se diz na linguagem popular, “tempo é dinheiro”, portanto, economizar tempo também é um motivador de compra
- Sentir-se bem – entenda-se por sentir-se bem como eliminar dores, medos, preocupações, gerar sensação de realização, felicidade, tranquilidade ou qualquer outro estado de espírito que uma pessoa possa querer buscar para si ou para sua organização.
Uma vez que compreendemos essas quatro razões temos que passar a identificar junto aos PB, TB, EB qual ou quais os seus motivadores para a compra, para então explorarmos esses motivadores no processo comercial junto a essa figura no processo.
- Compreender o que é valor para o cliente e os “componentes” da “equação” valo
O próximo passo fundamental neste processo é compreender o que é valor para o seu cliente, afinal se você quer sair da disputa por preço simplesmente, portanto sair da briga da commodity, compreender o que é valor é fundamental.
A equação valor é uma conta bastante simples.
Valor = benefícios – custos
Apesar de ser uma equação simples, é importante entender os componentes desta equação. Os benefícios podem ser divididos em quatro categorias:
- Experimentais – experiência ao usar, comprar, degustar, etc. em todos os sentidos
- Pessoais – como eu me sinto ou me faz bem, quais as realizações ou conquistas que quero ter
- Sociais – como eu quero ser visto e percebido pelos outros
- Funcionais – quais funções e atributos eu irei receber
O lado dos custos também é composto por quatro variáveis:
- Físico – qual o esforço ou desgaste para adotar uma solução, produto ou serviço
- Temporal – quanto tempo tem que ser investido para a adoção
- Psicológico – quais os riscos relacionados à adoção
- Monetário – quanto custa adotar uma solução, produto ou serviço
Uma vez que compreendemos os benefícios e custos e conseguirmos demonstrar para nossos clientes que os benefícios são maiores que os custos, aumentamos as chances de vendermos.
- As três fases que qualquer reunião de vendas deveria ter
Vamos primeiro definir o que significa uma reunião de vendas. Uma reunião de vendas é qualquer oportunidade que temos de falar com nosso cliente, estabelecer algum relacionamento com ele.
Portanto uma reunião de vendas pode acontecer em qualquer etapa do processo de vendas, desde a suspeita até o pós-vendas. A reunião de vendas pode ser através de um contato presencial, por telefone, por videoconferência por WhatsApp, etc.
Toda reunião de vendas deveria ser sempre dividia em 3 fases conforme a figura abaixo:
- Informação – nesta fase da reunião deveríamos levantar e validar as informações que necessitamos para evoluir no processo de vendas. Falo deveríamos porque normalmente, essa é a fase mais negligenciada pelos vendedores durante qualquer reunião de vendas. Afinal para fazer a fase informação bem-feita, temos que fazer perguntas, preferencialmente abertas, o que faz com que o nosso controle da reunião seja baixo, pois dependendo da resposta do cliente, temos que fazer a próxima pergunta. Isso exige muita preparação do vendedor e muita agilidade mental, portanto algo normalmente fora da zona de conforto do vendedor, justamente por isso que essa fase é tão negligenciada. A maioria dos vendedores preferem pular essa etapa e partir para uma apresentação da sua solução. Neste momento costumo dizer que a sorte está lançada, pois eventualmente durante a apresentação do vendedor, os principais pontos de necessidades e valor para o cliente podem aparecer, aí obviamente temos também que contar com a sorte de o nosso cliente está prestando atenção naquele momento. Afinal se esse ponto específico aparece no minuto 27 da apresentação, a chance do comprador estar com a cabeça em outro lugar, afinal de contas os 26 primeiro minutos não trouxeram nada que prendesse a atenção dele.
- Benefício – uma vez que validamos as necessidades do cliente na fase informação, aí sim chega a hora de apresentar os benefícios que vamos oferecer ao cliente que tratam os pontos levantados na fase anterior
- Obtenção de compromisso – nesta fase da reunião de vendas vamos buscar o compromisso do cliente para a próxima etapa do processo de vendas. Por exemplo, se eu estou na etapa suspeita e a próxima etapa é a etapa oportunidade, o compromisso que eu quero do cliente é de aceitar marcar uma reunião pessoal para apresentarmos nossas soluções, se eu estou na etapa oportunidade e a próxima é a etapa negociação o compromisso que quero do meu cliente é aceitar receber uma proposta. Já se estou na etapa negociação e a próxima é a fechamento, o compromisso que quero do cliente é o aceite na proposta. Portanto a fase obtenção de compromisso pode e deve variar de situação em situação, de empresa para empresa de etapa do processo para etapa do processo.
Compreendendo-se o resultado desta pesquisa, conduzida pela Dra. Jackson sobre “Customer Behavior” (comportamento do consumidor) poderíamos inferir que as estratégias de marketing e vendas deveriam ser adaptáveis ao lado do espectro ao qual o produto ou serviço está, ou mais se aproxima. Seria esta a resposta? Depende.
Depende do que a estratégia de marketing e vendas se propõe.
Se a sua empresa consegue ser competitiva no mesmo lado do espectro em que a característica de decisão dos seus compradores está, você deveria se aprimorar. Investir naquilo que são os fatores de
decisão dos seus compradores e ganhar o maior número de vezes que conseguir. Bingo! Sua estratégia está acertada e você consegue entregar “valor” aos seus clientes.
Por exemplo, se você está do lado “Transacional” seus esforços na cadeia de valor da sua empresa deveriam ser capazes de lhe colocar em vantagem competitiva para ter o melhor “pacote de oferta”. Aqui, deste lado do espectro imaginário, como dissemos antes, os preços competitivos, as entregas consistentes e rápidas e os padrões de qualidade que garantem o que é demandado são determinantes para definir quem irá levar o negócio.
Poderíamos acrescentar a ideia de que a estratégia de “transações repetidas” onde o vendedor e comprador aprendem a compartilhar dos conhecimentos e conceitos de “ganha – ganha” preconizados na “teoria dos jogos” são recomendados, uma vez que sempre haverá uma próxima rodada.
Lembrem-se, são compras de horizonte curto e provavelmente repetidas.
Estabelecer uma relação de confiança pessoal, relacionamentos transparentes, com oportunidades mútuas de todos ficarem satisfeitos pode ser um diferencial, mas não suficiente para garantir o negócio.
O relacionamento pessoal é sempre bem-vindo, em qualquer lado do nosso espectro, porém se os seus produtos ou serviços não estão em boa posição de competição neste lado do espectro, por que provavelmente a sua base de custos, ou seu modelo de negócio não lhe permite obter vantagem competitiva no lado transacional, aí você tem que trabalhar duro.
A ideia aqui seria tentar movimentar o “comprador” na direção do lado onde você é competitivo.
Costumamos nos deparar com empresas nestas situações, que por vezes, reclamam que o “mercado” está interessado somente em preços baixos – “você investe em marketing e os clientes só querem preço baixo”- dizem muitos nestas situações.
As consequências disto são as margens da empresa sendo corroídas, pelo fato desta ter que “acompanhar” os preços de mercado.
Ora sabe-se que a melhor definição para uma commodity é que se trata de um produto que não tem diferencial competitivo, portanto, seu preço é arbitrado pelo mercado.
Pergunta-se: seu produto virou commodity? Seu produto tende a “commoditização”?
Se a resposta for sim você facilmente falando teria duas opções: preparar-se para ser um fornecedor de commodity ou sair deste mercado. Será? Cruel demais…
Vejamos, considerando que as condições de mercado, com a proliferação de competidores e aprimoramento dos compradores estão transformando seu mercado em cada vez mais em transacional, onde a “melhor oferta do dia” ganha, ou você consegue ser na maior parte do tempo essa melhor oferta, ou está na hora de agir com Marketing, no sentido da diferenciação.
Fácil de falar, porém complicado de fazer. É verdade, pois se fosse fácil seus competidores fariam e acabaria o diferencial.
Diferenciar-se basicamente tem ao menos 3 dimensões que podem ser realizadas isoladamente ou em conjunto.
Dimensão de Produto, onde você consegue explorar aspectos intrínsecos dos seus produtos e que de alguma forma oferendem benefícios de fato aos seus clientes. O que seria isto? Características que somente seu produto tem e que significam atender melhor as necessidades explícitas dos seus clientes.
Na sequencia podemos falar sobre a diferenciação através de serviços agregados, como garantia, atendimentos de emergência, serviços de pós-vendas, ou até mesmo forma de cobrar pelo produto. Se todos vendem e você aluga, talvez este diferencial seja suficiente para lhe garantir maior número de vitórias.
A terceira dimensão, que eu considero a mais nobre e difícil de ser alcançada, trata-se de conhecer com mais propriedade os problemas dos clientes. Exige ir além da dimensão daquele negócio, e conhecer como e para que o cliente quer seu produto.
Esta é a dimensão onde a empresa “vende uma solução e não um produto”. Difícil de atingir por que exige mudanças nos processos internos da sua empresa, como equipes treinadas, gestores alinhados com este tipo de negócio e fôlego para um ciclo de vendas mais longo.
Todavia o mais difícil nem seria esta parte e sim o cliente permitir que seja feito este trabalho. Lembre-se que estamos falando de clientes “transacionais”. Eles não precisam esperar pela conclusão do seu trabalho, eles querem liquidar este negócio e partir para o próximo, afinal se der errado, o custo de troca é baixo.
Caso você consiga entrar nessa seara, comemore, pois você começou a movimentar seu cliente na direção oposta do nosso espectro. Na medida que você for bem-sucedido neste diferencial seu cliente já não mais decidirá com base no melhor pacote de oferta somente, pois ele mudou os “Guias de Decisão” para compra. Quanto mais ele mover-se na direção da compra por relação corporativa e se for guiado por suas ações de marketing e vendas, melhor será o resultado para você, pois você o tirou da venda transacional para venda relacional.
É possível fazer isto com todos os produtos e clientes? Teoricamente sim, bastaria a empresa reconhecer qual é o seu posicionamento estratégico, avaliar se consegue ser bem-sucedida nele e, caso não seja, tenha condições de alterar.
Estamos falando de uma empresa que para competir do lado transacional posiciona-se como “Eficiência Operacional”, mas que percebe não ser mais possível continuar ou que poderá ter melhores resultados alterando para “Intimidade com Cliente” e decide que irá fazer. Vai lá e faz.
Onde está o risco e onde está o ponto de maior “erro” das empresas?
Talvez no ponto onde a “Máquinas e Soluções” possa ter falhado. Diga-se antes, que todas as decisões do Comitê executivo e as declarações do CEO estavam corretíssimas, porem não eram suficientes. Na física aprendemos que as vezes determinada condição é necessária, mas não suficiente para transformar algo. É isso.
Conclui-se este artigo com comprovação de que Marketing e Vendas tratam de uma série de coisas, mas principalmente do entendimento do comportamento de pessoas, costumamos dizer que entender de marketing e vendas é entender de gente. Cabe a empresa conhecer constantemente os comportamentos de compra dos seus clientes e de forma antecipada planejar movimentos de proteção para manter sua posição de vantagem ou de aceleração para promover mudanças. É fundamental ter a estratégia empresarial alinhada com aquilo que conta nas decisões de compras dos nossos clientes.
David Zini |
Mestre em Administração de Empresas-EASP/FGV, Especialista em Design Thinking – Yale Univ. e Pós-graduado em Business Analytics, Economics e Accounting – HBS, STC – FDC, CEAG – EASP/FGV, atualmente é professor associado da FDC no programa do PAEX e monitorias comercial. Já atuou como professor no IBMEC – SP e na Planorh – FAAP. |
Flavio Nusbaum |
Economistas pela PUC-SP e pós-graduado em Marketing pela ESPM-SP. É Consultor de empresas sócio fundador da MartinBaum Consulting desde 2007, professor da FDC – Fundação Dom Cabral desde 2012 e fundador do Clube da Consultoria. Como executivo atuou em diversas empresas como Banco Garantia, Banco Iochpe, Reuters, Bloomberg, Algorithmics, Siemens e AON. |
- Warren McFarlan and James L. McKenney, Corporate Information Systems Management: The Issues Facing Senior Executives(Homewood, Ill.: Richard D. Irwin, 1983); see also James I. Cash and Benn R. Konsynski, “IS Redraws Competitive Boundaries,” HBR March–April 1985, p. 134.
A version of this article appeared in the November 1985 issue of Harvard Business Review.